Hoje as leituras da Eucaristia apelam-nos à consciência de que para Deus o Amor e a misericórdia é mais importante que os meros ritualismos ou sacrifícios pelos sacrifícios.Muitas vezes, nós Cristãos, fazemos e oferecemos o que chamamos de sacrifícios, a Deus, por nós ou pelos outros sem nos questionarmos do como acolherá Deus tais ditos sacrifícios.
O que é para nós, afinal, um sacrifício?
Deixo aqui em partilha um texto do P. Anselmo Borges que a mim mesmo me serve de grande reflexão...
"Nas religiões, oferece-se sacrifícios à divindade - frutos, comida, animais, seres humanos -, para aplacá-la, agradecer, expiar os pecados, atrair bênçãos. A refeição sacrificial cultual criava relações de comunidade dos participantes com a divindade e entre si. Mas desgraçados dos seres humanos que foram oferecidos em sacrifício! Teria sido melhor não terem conhecido a religião. E que Deus seria esse que precisasse dos sacrifícios, sobretudo quando isso implicava a morte de homens ou mulheres?
A Bíblia, concretamente na sua linha profética, verberou os sacrifícios. Oseias põe na boca de Deus estas palavras: "Eu quero a misericórdia e não os sacrifícios, o conhecimento de Deus mais do que os holocaustos." E Amós: "Eu conheço as vossas maldades e a enormidade dos vossos pecados. Sois opressores do justo, aceitais subornos e violais o direito dos pobres no tribunal. Eu detesto e rejeito as vossas festas. Se me ofereceis holocaustos, não os aceito nem ponho os meus olhos nos sacrifícios das vossas vítimas gordas. Antes, jorre a equidade como uma fonte, e a justiça como torrente que não seca." E o profeta Isaías escreve: "De que me serve a mim a multidão das vossas vítimas? - diz o Senhor. Estou farto de holocaustos de carneiros, de gorduras de bezerros. Não me agrada o sangue de vitelos, de cordeiros nem de bodes. Quando me viestes prestar culto, quem reclamou de vós semelhantes dons, ao pisardes o meu santuário? Não me ofereçais mais dons inúteis. Cessai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem; procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas."
Jesus retomou a palavra profética de Oseias: "Ide aprender, diz o Senhor, o que significa: 'Prefiro a misericórdia ao sacrifício'" Ele enfrentou profeticamente a casta sacerdotal e expulsou os vendilhões do Templo, tendo sido este acontecimento determinante para a sua condenação à morte na cruz, na sequência de uma coligação internacional - Jerusalém e Roma -, com interesses sacerdotais, económicos e políticos ameaçados.
Afinal, um Deus que precisasse de sacrifícios era um Deus pior do que os seres humanos, quando vivem uma humanidade boa e feliz. Que pai ou mãe quer que os filhos andem de joelhos ou de rastos diante deles e lhes ofereçam sacrifícios?
O sofrimento pelo sofrimento é inútil e deve-se combatê-lo, bem como às religiões doloristas que pregam o sofrimento como agradável a Deus e a via mais directa para o céu. Deus não precisa nem quer sacrifícios. Deus, que é amor, quer amor e justiça para todos, dando preferência aos marginalizados e aos pobres. Mas cá está. A prática do amor e da justiça, a contribuição real para uma sociedade boa e justa e mais feliz implicam capacidade de sacrificar-se. Agora, porém, é diferente: não se trata do sacrifício pelo sacrifício, mas das melhores causas da vida, que inevitavelmente exigem renúncia, entrega, doação. Aqui, o sacrifício surge em toda a sua dignidade, dita já no étimo latino: sacrum facere - tornar sagrado. Não há amor nem obra grande nem salvaguarda da humanidade na sua dignidade, sem a disposição para sacrificar-se pelo melhor. Quem ousa então ir até ao fim, superando os obstáculos do egoísmo e da preguiça e da mesquinhez e da opressão e entregando-se à realização da humanidade de todos os homens, faz algo de sagrado, torna o mundo humano e sagrado.
Por exemplo, Sócrates podia, como lhe foi oferecido, ter feito um compromisso. Isso era, porém, contra a voz da consciência, e Sócrates não atraiçoou a sua mensagem e bebeu a cicuta.
Jesus não morreu para aplacar a ira divina ou porque Deus precisasse do sacrifício da sua morte. O sacrifício pelo sacrifício é detestável e a morte não salva ninguém. O que se passa é que também Jesus, em vez de fugir ou optar por compromissos, foi consequente com a sua mensagem e deu testemunho, até ao fim, até à morte, da verdade e do amor, do Deus que não quer sacrifícios, mas misericórdia, defesa dos direitos humanos, fraternidade, liberdade, amor entre todos.
Quando se fala de nova evangelização, é disto que se trata: acreditar, com todas as consequências, no Evangelho enquanto notícia boa do Deus que é amor e que não tolera vítimas. De facto, é em nome do Deus que quer vítimas que nós próprios, pela guerra, mediante a exploração omnímoda (ilimitada) e sem escrúpulos, continuamos a fazer vítimas. Deus, porém, o que quer é misericórdia. A paixão por Deus traduz-se por compaixão real e efectiva para com os homens e mulheres.
Também em Portugal as questões da justiça social têm de ser prioritárias..."
Dr. P. Anselmo Borges
A Bíblia, concretamente na sua linha profética, verberou os sacrifícios. Oseias põe na boca de Deus estas palavras: "Eu quero a misericórdia e não os sacrifícios, o conhecimento de Deus mais do que os holocaustos." E Amós: "Eu conheço as vossas maldades e a enormidade dos vossos pecados. Sois opressores do justo, aceitais subornos e violais o direito dos pobres no tribunal. Eu detesto e rejeito as vossas festas. Se me ofereceis holocaustos, não os aceito nem ponho os meus olhos nos sacrifícios das vossas vítimas gordas. Antes, jorre a equidade como uma fonte, e a justiça como torrente que não seca." E o profeta Isaías escreve: "De que me serve a mim a multidão das vossas vítimas? - diz o Senhor. Estou farto de holocaustos de carneiros, de gorduras de bezerros. Não me agrada o sangue de vitelos, de cordeiros nem de bodes. Quando me viestes prestar culto, quem reclamou de vós semelhantes dons, ao pisardes o meu santuário? Não me ofereçais mais dons inúteis. Cessai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem; procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas."
Jesus retomou a palavra profética de Oseias: "Ide aprender, diz o Senhor, o que significa: 'Prefiro a misericórdia ao sacrifício'" Ele enfrentou profeticamente a casta sacerdotal e expulsou os vendilhões do Templo, tendo sido este acontecimento determinante para a sua condenação à morte na cruz, na sequência de uma coligação internacional - Jerusalém e Roma -, com interesses sacerdotais, económicos e políticos ameaçados.
Afinal, um Deus que precisasse de sacrifícios era um Deus pior do que os seres humanos, quando vivem uma humanidade boa e feliz. Que pai ou mãe quer que os filhos andem de joelhos ou de rastos diante deles e lhes ofereçam sacrifícios?
O sofrimento pelo sofrimento é inútil e deve-se combatê-lo, bem como às religiões doloristas que pregam o sofrimento como agradável a Deus e a via mais directa para o céu. Deus não precisa nem quer sacrifícios. Deus, que é amor, quer amor e justiça para todos, dando preferência aos marginalizados e aos pobres. Mas cá está. A prática do amor e da justiça, a contribuição real para uma sociedade boa e justa e mais feliz implicam capacidade de sacrificar-se. Agora, porém, é diferente: não se trata do sacrifício pelo sacrifício, mas das melhores causas da vida, que inevitavelmente exigem renúncia, entrega, doação. Aqui, o sacrifício surge em toda a sua dignidade, dita já no étimo latino: sacrum facere - tornar sagrado. Não há amor nem obra grande nem salvaguarda da humanidade na sua dignidade, sem a disposição para sacrificar-se pelo melhor. Quem ousa então ir até ao fim, superando os obstáculos do egoísmo e da preguiça e da mesquinhez e da opressão e entregando-se à realização da humanidade de todos os homens, faz algo de sagrado, torna o mundo humano e sagrado.
Por exemplo, Sócrates podia, como lhe foi oferecido, ter feito um compromisso. Isso era, porém, contra a voz da consciência, e Sócrates não atraiçoou a sua mensagem e bebeu a cicuta.
Jesus não morreu para aplacar a ira divina ou porque Deus precisasse do sacrifício da sua morte. O sacrifício pelo sacrifício é detestável e a morte não salva ninguém. O que se passa é que também Jesus, em vez de fugir ou optar por compromissos, foi consequente com a sua mensagem e deu testemunho, até ao fim, até à morte, da verdade e do amor, do Deus que não quer sacrifícios, mas misericórdia, defesa dos direitos humanos, fraternidade, liberdade, amor entre todos.
Quando se fala de nova evangelização, é disto que se trata: acreditar, com todas as consequências, no Evangelho enquanto notícia boa do Deus que é amor e que não tolera vítimas. De facto, é em nome do Deus que quer vítimas que nós próprios, pela guerra, mediante a exploração omnímoda (ilimitada) e sem escrúpulos, continuamos a fazer vítimas. Deus, porém, o que quer é misericórdia. A paixão por Deus traduz-se por compaixão real e efectiva para com os homens e mulheres.
Também em Portugal as questões da justiça social têm de ser prioritárias..."
Dr. P. Anselmo Borges



8 comentários:
Querida Família Retalhos, neste cantinho do céu, eis que somos agraciados com tão profunda reflexão sobre o sacrifício; nunca tinha lido algo assim.
Que Deus o abençoe Amigo, pela fonte e dom que se tem sido, para matar a sêde a esta Família.
E vou pensar, que quer Deus de nós afinal?
Que quer um Pai, de um filho?
É tempo de reflectir...
Obrigada.
Seja por Caridade
Amigo:
Hoje à tarde fui à missa a um sítio que você gosta muito, à Igreja de Stº. António.
Conhecia o Frei Armindo, mas nunca tinhamos falado. É um humilde servo de Deus.
Este tema Misericórdia Divina é para mim dos mais belos.
O Amor de Deus é um amor de misericórdia. É o coração de Deus debruçado sobre a miséria humana. É assim na parábola do Bom Pastor, o pastor debruça-se até ao chão para pegar na ovelha perdida, põe aos ombros, vai para casa e faz festa.Pô-la aos ombros é pô-la dentro do coração.
O Pai do Céu faz isso connosco, acolhe-nos, beija-nos e abraça-nos, porque o filho apesar de pecador não deixa de ser filho.
Foi assim que Jesus fez com Zaqueu, com a samaritana,com o bom ladrão e tantos outros... faz hoje o mesmo connosco.
Precisamos ser apóstolos da misericórdia. Acolhamos esta misericórdia na nossa vida, porque o nosso Deus é um Deus de paixão, de festa, não só perdoa, mas alegra-se em perdoar.
Bem Haja! Que Deus o abençoe!
Olá Amigo! Mas que riqueza de texto… Que reflexão tão profunda e tão rica com que nos presenteou sobre o sacrifício!!!
Que Deus continue a abençoá-lo por tantos DONS com que nos tem enriquecido e agraciado neste blog…
CORAÇÃO DE JESUS “MISIRICÓRDIA” (MISERICORDIOSO)
Sabendo que deveria voltar ao Pai, depois da Missão cumprida, Cristo pensou como ficar no meio de nós… O Amor pede presença…Quem Ama quer ficar perto…junto…
Mesmo antes de partir, regressando ao Pai, Jesus sentiu saudades antecipadas de cada um de nós… Foi por isso que instituiu o sacramento da Eucaristia, Mistério de Amor “Misericórdia”…
No alto do Calvário Jesus imola-se para a salvação da humanidade. Séculos passaram e a humanidade ainda hoje ajoelha ao pé da Cruz, e reflecte sobre esse “OCEANO” de BONDADE E MISERICÓRDIA que é o Coração aberto de Cristo, nosso Salvador. Na Encíclica “ Redentor do Homem”, João Paulo II, peregrino da Paz num mundo tão conturbado, diz-nos que somente Jesus Cristo é o Caminho, A Verdade e a salvação dos homens, em todos os tempos. Na encíclica “Rico em Misericórdia”depois de analisar a violência no mundo, o arsenal atómico que pode levar-nos à autodestruição, as injustiças sociais, a febre do consumismo, a fome e a miséria de tantos de nossos irmãos, João Paulo II concluiu:
“É pela Misericórdia que o homem, na verdade íntima de sua existência, se encontra particularmente de perto e com muita frequência com Deus Vivo. Este encontro é a fonte de esperança para o nosso tempo… Mas é necessário também o encontro do homem com o homem, que se dá através da Misericórdia, pois quem a pratica é por ela abençoado”
O mundo, a Igreja e os homens de hoje, precisamos todos de Misericórdia Divina, mais do que nunca, de Justiça, de Paz, de Verdade, de Perdão, de Amor e Misericórdia uns para com os outros, do que de sacrifícios, para obtermos algo em troca…
Que nos saibamos amar uns aos outros, nas dimensões do Coração de Jesus Cristo, para que diminuam as intustiças, o ódio, a inimizade, as vinganças, a exploração...
Que ELE nos dê um coração justo, e generoso, e que o Evangelho penetre profundamente na vida de cada um de nós, frutificando Harmonia, Unidade, Concórdia, Paz, Fraternidade e Amor...
Registro minha passagem aqui, enviando um alô a toda a Família, assinando em baixo do que dizem a Maresia, Mariana e Dina, e confesso que com inveja da Mariana pela visita ao Santuário de Santo Antonio, privilégio para quem pode e não para quem quer, não é mesmo Frei Albertino?
Desejo uma semana frutífera, cheia de trabalho e bênçãos do Amado a todos
Sirlene ( Brasil )
Sirlene: Paz e bem!
Diz o povo que "querer é poder".
Este é um daqueles ditos que não pode, de todo, ser levado à letra.
Querer, queremos todos dós muita coisa mas nem sempre as circunstâncias que nos rodeiam o permitem.
Por isso diz o filósofo que "nós somos nós e as nossas circunstâncias".
o querer nosso pode nem sempre ser o querer de Deus. E quando está em causa o querer de Deus para o nosso bem e o bem dos que nós rodeiam, não tenho a menor dúvida que - ainda que na hora possamos não o entender - Deus coloca à nossa volta o que acha ser melhor para nós.
Visitar o Santuário de St. António é um bem, sem dúvida, para quem está perto ou de longe se pode deslocar a Portugal. Para quem não o pode fazer entregue a Deus a acçã de graças por todos os que ali rezam por todos nós...
Rezo...
Não consigo separar o que é misericordia e o que é amor de Deus.Pra mim ambos são o mesmo.
Sinto -me amada sempre e cada vez mais quando Deus age com miserciordia para comigo.Isso é sinal de amor.Quem dera agissemos com misericordia para com o irmão, seria o mesmo que ama-los!
Olá Sirlene:
É verdade o que diz o Frei, há coisas que gostaríamos muito de fazer, mas não podemos lá chegar... quem sabe talvez um dia...! Eu fui sim, à Capela de Santo António,(como estou em Lisboa vou de vez em quando), sabe essencialmente fazer o quê desta vez? Santo António é o protector dos objectos perdidos, e há uma oração, milagrosa, chamada "Responso a Stº. António" que rezada com o coração, o santo faz apareder... isto é complicado de explicar para você que não conhece esta nossa "tradição". Mas, uma amiga minha não sabe do passaporte, não o encontra, então eu fui rezar o Responso a Stº. António para aparecer o respectivo...!
Se você quiser nós podemos dar para si, esta oração, que é cantada, nesta altura do ano, na Capela de Stº.António, no final das missas, porque dia 13 é o dia de Stº. António, onde se faz uma procissão linda pelas ruas antigas de Lisboa (Alfama), com o nosso Amigo, Frei Albetino, sempre a entoar a sua voz, cantando, com o grande Dom que Deus lhe deu.
Quem sabe, um dia você vem a Portugal, eu mostro-lhe Lisboa... até lhe ofereço a minha humilde casa para ficar.
Abraço! rezemos por tudo que temos de aceitar... isto não é nada, comparado com tantas outras, que acontecem na nossa vida.
Eu tive a oportunidade de te ouvir em Eucaristia...
Falavas precisamente de sacrifícios... novamente que Deus não pede o sacrifício pelo sacrifício... nem humano, nem Animal!
E o coro que ensaias ecoou na minha Alma...
Foi uma Eucaristia comovente!
senti-te "embebido" do Espírito Santo enquanto o teu olhar percorria todas as pessoas que contigo comungavam das tuas palavras... senti um coro "santificado" quase "angélico" que as pessoas seguiam com a Alma cheia de Amor...
... E há quanto tempo não assistia a uma Missa assim...
No final pediste desculpa, pois se tivesses magoado alguém que já tivesse percorrido algum caminho de joelhos, não era o teu intuito...
Albertino, não há porque pedir desculpa... o sacrifício de cada um está na sua própria Alma.
E quando uma Alma sangra não há porquês!
Obrigada pelas tuas palavras, pelo teu olhar, pelo teu coro, pela tua benção!
Clara de Assis
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